Merval Pereira, O Globo
O movimento contra a corrupção, que vai ganhando corpo em todo o país através da convocação de manifestações pelas redes sociais, está tendo um efeito colateral imediato: o fortalecimento da campanha pela adoção do voto distrital, que também está sendo feita através da internet.
Os organizadores do movimento #votodistrital experimentaram um crescimento considerável da adesão ao manifesto, que está no site http://www.euvotodistrital.org.br, a partir das manifestações ocorridas no Dia da Independência.
Enquanto escrevia esta coluna, já eram mais de 55 mil pessoas aderindo ao manifesto a favor do voto distrital na internet.
O Centro de Liderança Política (CLP), dirigido por Luiz Felipe D’Ávila, é que está coordenando o movimento e a arrecadação de doações. O site da campanha foi feito e é mantido por voluntários, e diversas pessoas vão procurando o movimento e oferecendo ajuda à medida que ele se torna conhecido.
Tudo indica que a sociedade está fazendo a ligação entre a corrupção e as faltas de fiscalização, de responsabilização e de representatividade, dando esperanças aos organizadores da campanha de que ela se torne um movimento no mesmo feitio da proposta popular que criou a Lei da Ficha Limpa.
A iniciativa popular é um instrumento previsto na Constituição que permite que um projeto de lei seja apresentado ao Congresso desde que, entre outras condições, apresente as assinaturas de 1% de todos os eleitores do Brasil, isto é, cerca de 1,3 milhão de pessoas.
A alteração do sistema eleitoral só pode ser feita pelo menos um ano antes da realização de eleições, e como a ideia dos coordenadores do movimento é testar o voto distrital nas eleições municipais de 2012 nas cidades com mais de 200 mil habitantes, essa proposta teria que chegar ao Congresso no final de setembro, o que é inviável.
No entanto, a movimentação pelo voto distrital continuará para que o assunto entre na pauta do Congresso e possa se transformar em realidade o mais breve possível.
No manifesto, o voto distrital aparece como o oposto ao voto em lista fechada, que está na proposta de reforma política do deputado Henrique Fontana, do PT.
Diz o manifesto: “Acreditamos que o eleitor tem de manter vivo na memória o seu voto, o que certamente acontecerá quando um parlamentar representar o seu ‘distrito’. A base da proposta é aproximar o eleitor de seu candidato e dar a ele a capacidade de fiscalizar e cobrar sua atuação.
“Esse voto, condicionado também pela geografia, traz o benefício adicional de evitar que a Câmara dos Deputados se limite a uma Casa de representação de lobbies.
“O Congresso não pode ser uma reunião de meras corporações a serviço de interesses setoriais. Justamente porque queremos um eleitor mais próximo do eleito de seu distrito, repudiamos ainda o chamado ‘voto em lista fechada’, proposta que fortaleceria unicamente as burocracias partidárias, permitindo a eleição de parlamentares sem rosto.
“O voto distrital, ao dar poder ao eleitor para fiscalizar e cobrar o desempenho de seus representantes, contribuirá para melhorar o Poder Legislativo, o que elevará a qualidade da nossa democracia.”
O que dificulta a aprovação de sistemas eleitorais que adotem a divisão dos estados em distritos é alegadamente o desequilíbrio na representação popular, que faria com que o eleitor dos grandes centros fique em desvantagem. Tendo em vista o pluripartidarismo brasileiro, há também o risco de a definição da vontade das maiorias ser uma tarefa complexa e polêmica. Com 21 partidos disputando a eleição em um distrito para uma vaga, como o eleito representará a maioria?
Por isso a proposta de voto distrital puro é a preferida, com dois turnos, se preciso, para garantir que o vencedor tenha a maioria.
Também o especialista em pesquisas de opinião pública Örjan Olsén foi contratado para determinar se seria possível dividir o Brasil em distritos com número de eleitores próximo aos quocientes para eleição de um deputado federal ou estadual e para vereadores.
O objetivo era alcançar um desenho inicial de distritos que formassem uma unidade geográfica contínua. Para tanto, foram usados dados censitários, puramente geográficos, sem influência de critérios de histórico de voto, respeitando ao máximo os limites municipais nos distritos para deputado e os limites de distritos ou bairros nos distritos para vereador.
Foram utilizados os mesmo critérios do IBGE, como mesorregiões ou microrregiões.
A primeira é uma subdivisão dos estados brasileiros que congrega diversos municípios de uma área geográfica com similaridades econômicas e sociais.
As microrregiões foram criadas pela Constituição de 1988 e são um agrupamento de municípios limítrofes.
Sua finalidade é integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum, definidas por lei complementar estadual.
Como são raras as microrregiões formalizadas, o termo é muito mais conhecido em função de seu uso prático pelo IBGE, que, para fins estatísticos e com base em similaridades econômicas e sociais, divide os diversos estados da Federação brasileira em microrregiões.
Foi respeitado o número de cadeiras existentes para cada estado na Câmara dos Deputados, nas Assembleias Legislativas e na Câmara de Vereadores, e criados tantos distritos quantas cadeiras estarão sendo disputadas.
Curitiba, por exemplo, seria dividida em cinco distritos na eleição para deputado federal, cada qual elegendo um candidato.
São Paulo teria 55 distritos para a eleição de vereadores, e, por exemplo, bairros como Bela Vista, Consolação, Liberdade e República seriam unidos em um distrito, de acordo com critérios técnicos.
Cada distrito teria cerca de 150 mil eleitores para a eleição de vereador. (Continua amanhã)
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